segunda-feira, 27 de setembro de 2010

O significado dos milagres de Jesus


Para se entender o significado dos milagres de Jesus é preciso entender sua chave interpretativa. O evangelho de João nos oferece a chave interpretativa dos milagres, movimentos e ensinamentos de Jesus. E para entendermos o significado dos milagres de Jesus temos que fazer duas perguntas para o evangelista João:

(1) Quantos milagres foram feitos por Jesus? “Há, porém, ainda muitas outras cousas que Jesus fez. Se todas elas fossem relatadas uma por uma, creio que nem no mundo inteiro caberiam os livros que seriam escritos.” (Jo 21:25). Ou seja, o evangelista João nos diz, por meio de uma hipérbole - que é uma figura de linguagem que aponta para um exagero intencional com a finalidade de tornar mais expressiva sua idéia – quando nos diz que os feitos de Jesus são imensuráveis a ponto de que se fossem registrados em livro, mesmo numa biblioteca do tamanho do mundo, não caberiam no universo. Isso quer dizer, em outras palavras, que os feitos de Jesus são incontáveis. Sendo assim, podemos concluir que muitos outros milagres de Jesus não foram registrados, uma vez que o evangelista João afirma que “Na verdade, fez Jesus diante dos discípulos muitos outros sinais que não estão escritos neste livro.” (Jo 20:30).  Apenas alguns milagres foram selecionados para serem registrados nos evangelhos. Mas diante disso, surge outra pergunta: Por que este e não aquele milagre foi registrado? Isso significa que os milagres foram escolhidos a dedo. Somente os milagres selecionados pelo evangelista inspirado pelo Espírito Santo foram registrados. E se foram registrado, eles têm um propósito de estarem na seleção dos milagres. Então, surge a segunda pergunta:

(2) Qual o propósito do milagre? Da mesma forma, o evangelista João responde: “Estes, porém, foram registrados para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome.” (Jo 20:31). Está respondido: Os milagres foram feitos por Jesus e registrados pelos evangelistas para gerar fé em Jesus como o Cristo, o Filho de Deus, e todo o que crer nele, tenha a vida eterna. Ou seja, os milagres têm o propósito de gerar discípulos de Jesus. Isso acaba com qualquer conceito de que os milagres são apenas uma demonstração de poder de Deus, do poder de quem pede ou do poder de quem os recebe; ou de que os milagres são realizados apenas para satisfazer a curiosidade do pedinte; ou os milagres são feitos apenas para satisfazer temporariamente os gulosos e insaciáveis desejos consumistas do fiel; ou ainda, cai por terra o discurso religioso de que os milagres tem que acontecer por que é a obrigação de Deus em cumprir seu papel na barganha feita pelo crente fiel.

No evangelho de João, o milagre da multiplicação de pães e peixes é considerado o quarto sinal que aponta para a identidade messiânica de Jesus. E é interessante notar que este milagre é o único que aparece em todos os quatro evangelhos (MT 14:13-21; Mc 6:32-44; Lc 9:10b-17). E também é interessante notar que todo milagre de Jesus é chamado de sinal por João, como interpretação de que o milagre aponta para a identidade e obra de Jesus. Sendo assim, podemos perceber que esse milagre é especial, uma vez que foi registrado pelos quatro evangelistas. E se foram registrados é porque esse milagre tem muito que revelar sobre a identidade de Jesus e produzir fé salvadora e discipulado.

Agora volte mais uma vez os olhos para o texto sagrado e perceba que o objetivo dos milagres é gerar um relacionamento de fé salvífica e discipulado no relacionamento contínuo entre Deus e quem recebe o milagre. E além do mais, mesmo que nós não recebamos os milagres hoje, mesmo assim, os milagres de Jesus já foram feitos e registrados de uma vez para sempre para que todos creiam em Jesus para a salvação e discipulado. Isso implica dizer que se Deus não fizer agora o milagre que tanto desejamos, não temos o direito de ameaçar Deus de abandoná-lo com nossa incredulidade; uma vez que, nossa fé está na Palavra de Deus de que ele já fez milagres para evidenciar sua identidade messiânica de salvador do mundo. E Deus não necessita mais provar, periodicamente a cada geração e a cada indivíduo, por meio de milagres, a sua identidade de que ele é o Senhor e Salvador de todos. Até porque temos muitos exemplos na Bíblia, na nossa vida pessoal e íntima de fé, e na experiência religiosa nos templos negociadores de milagres que ninguém, necessariamente, se torna salvo e continua firme na fé como discípulos de Jesus baseado, exclusivamente, nos milagres recebidos.

Vejamos alguns exemplos: Na Bíblia, para satisfazer nosso interesse e objetivo, só basta citar dois exemplos. O primeiro se encontra na época dos juízes. O ciclo dos juízes é composto por uma reincidência contínua de apostasia, idolatria, opressão, ruína, arrependimento, clamor, livramento, restauração e trégua. E logo após a trégua, começa a apostasia novamente, completando um ciclo vicioso continuo e ininterrupto de pecados. Ou seja, após o milagre recebido, o povo se volta para a amnésia espiritual cheia de murmuração e ingratidão pelo milagre recebido, quando se deleita impiamente no pecado da apostasia cheia de incredulidade. Outro exemplo bíblico está no encontro de Jesus com os dez leprosos (Lc 17:11-19). Como sabemos, os 10 leprosos foram curados de sua enfermidade física, mas apenas um voltou para agradecer com fé em reconhecimento à identidade de Jesus. E este foi salvo, curado também de sua enfermidade espiritual de pecado. Ou seja, a maioria dos que recebem os milagres de Deus, imediatamente se esquecem de agradecer e ter um vínculo afetivo de amor e submissão com fé para a salvação e discipulado. A maioria só busca Deus para receber os milagres de suas necessidades efêmeras, materiais e físicas; e não querem as bençãos eternas da salvação e da cura espiritual do pecado pelo perdão Deus.

Semelhantemente, temos o exemplo pessoal de fé. Sabemos que nós já recebemos muitos milagres extraordinários de Deus, mas muitas vezes esses milagres são logo esquecidos e Deus é colocado para escanteio em nossa vida. Estamos cansados de perceber muitas pessoas alcançadas pelos milagres da graça de Deus ficarem alegres no primeiro momento e responderem com a promessa de consagração e gratidão servindo ao Senhor. Mas, com o passar do tempo, aquele que recebeu o milagre esquece da promessa feita e volta a pecar continuamente e a cruzar os braços diante do serviço na obra do Senhor.

Da mesma forma, os templos cristãos estão lotados de pessoas buscando, exclusivamente, os milagres; e quando os recebem, abandonam a Deus. As portas dos fundos dos templos estão sendo mais largas do que as portas de entrada. A maioria que entra é a mesma que sai imediatamente após o milagre ser recebido. Isso acontece, muitas vezes, porque os milagres são vendidos nesses templos. E venda é negócio, e negócio exclui qualquer laço afetivo da graça de Deus. Com isso, há o trânsito variável e mutante de fiéis que entram e saem despidos de um discipulado radical de serviço em amor a Deus.

Notando esses exemplos bíblicos, pessoais e religiosos, podemos confirmar a tese de que os milagres feitos por Jesus são sinais que evidenciam a revelação da identidade messiânica de Jesus como Senhor e Salvador. Estes sinais foram registrados para produzir fé salvadora e discipulado em quem recebe ou testemunha os milagres.    

Em Cristo, o milagre que o mundo tanto carece 
Jairo Filho

O milagre da provisão e a provisão do milagre

INTRODUÇÃO
 
Vivemos num contexto de fome, miséria, desemprego, doenças, analfabetismo, injustiça social, má distribuição de renda, sofrimento, pobreza, prostituição, pedofilia, sincretismo religioso, corrupção política, capitalismo selvagem, roubo, violência, consumismo, drogas, divórcio, morte e etc. A sociedade é um cenário de pecado e pecadores; é um cemitério de defuntos espirituais dominados pelas façanhas do Diabo; é um reino de trevas e maldades.

Também vivemos trancados em nosso mundinho egoísta de prazeres, compromissos, trabalhos e agendas superlotadas de ativismo que não permitem espaço para uma convivência íntima sem pressa com Deus, consigo mesmo e com o próximo. Estamos condicionados ao vício de olhar exclusivamente para o horizonte do nosso umbigo, enquanto cada um vive por si e para si só. O deus desse século está dentro de cada um de nós. O templo religioso da nossa geração são os corpos plastificados que cultivam a ego-latria do individualismo.

A propagação da cultura filosófica do hedonismo que dissemina um sentido de vida exclusivo na busca insaciável pelo prazer egoísta; o ativismo profissional como mola propulsora para o ganho e acúmulo de riquezas a todo custo, excluindo a dignidade da vida humana em troca de capital; e a busca frenética pelo abandono do anonimato no lugar da fama, poder, status, sucesso e glória vêm preenchendo a agenda existencial das prioridades e sonhos da nossa sociedade. Ou seja: hedonismo egoísta, consumismo capitalista e poder político estão se destacando cada vez mais como a tríade da satisfação dos gulosos desejos humanos.

Além disso, quando surge à contra cultura de serviço ao próximo em suas necessidades, sempre encontramos muitos desafios e adversidades no caminho. O maior deles está dentro de nós mesmo. É a competição, intriga, partidarismo, inimizade, murmuração, pessimismo, ingratidão e guerra construídas entre as pessoas do mesmo time. Esses adversários são fabricados dentro de nós mesmos e paridos como inimigos íntimos que destroem toda ação social beneficiente e comunitária. Infelizmente, o espírito solidário e altruísta desaparece com o espírito competitivo disseminado na cultura da formação de equipes. E assim, todo trabalho solidário perde a guerra contra o mundo para si mesmo.

Diante desses contextos citados de mazelas sociais, do egoísmo pessoal e do espírito competitivo, ainda existe uma multidão de pessoas carentes e desesperadas pelo milagre da salvação. Há ainda inúmeras pessoas perdidas sem rumo moral; enterradas na depressão existencial; estressadas pela ansiedade do ativismo profissional; pressionadas pelo consumismo capitalista; violentadas pelas relações humanas maléficas; extasiadas com o hedonismo indiferente e apático à dor humana; entorpecidas pela vida de drogas e pela droga de vida; famintas por pão de fermento e pão da vida; presas na rotina do tédio monótono e enfadonho; enfermas, agonizando de dor na idosa fila do apático socorro humano; frustradas consigo mesmas e decepcionadas com o próximo; traumatizadas pelas tragédias da vida; vazias de sentido de vida e corações vazios de amor. Sendo assim, somente um milagre para transformar o mundo.

Com isso, como podemos socorrer as mazelas da multidão e acabar com a multidão de mazelas no mundo? Como fazer um milagre para a multidão em seus problemas e acabar com os problemas da multidão? Como oferecer o milagre da transformação de vidas? É pensando nesse contexto de mazelas sociais, pessoais e relacionais que convido você a encontrar boas pistas de como oferecer o milagre de salvação para essa multidão carente e faminta por vida.

A partir do milagre da multiplicação de sanduíche de peixe (MT 14:13-21; Mc 6:32-44; Lc 9:10b-17), levanto a seguinte tese:

DEUS SUPRE TODAS AS NECESSIDADES HUMANAS COM O MILAGRE DA PROVISÃO,
FAZENDO PARCERIAS COM QUEM ESTÁ DISPONÍVEL PARA FAZER A OBRA DELE ACONTECER.

Ou seja, o milagre da provisão é nos transformar na provisão do milagre. Somente assim, pode acontecer o milagre da transformação da multidão de vidas.

Em Cristo, o milagre da provisão de ser a provisão do milagre


Jairo Filho

domingo, 26 de setembro de 2010

Esta é a nossa Escola Bíblica Dominical

"Essa é a nossa escola, a escola dominical; 
Essa é a nossa escola, a escola sem igual;  

Escola sem igual que faz bem a muita gente; 
Quem não vem à essa escola com certeza esta doente;
 


Com certeza está doente ou estava trabalhando; 
Quem trabalha nesse dia do senhor está roubando;
 
Do senhor está roubando quem aqui chega atrasado; 
O seu nome fica ausente e ele fica envergonhado;  
Ele fica envergonhado por não saber a lição;
Professor faz a pergunta ele diz: eu não sei não!
 
Não sei não..não sei não ..(2x)
Professor faz a pergunta ele diz: eu não sei não!”

Essa é a letra de uma música que eu cantava na igreja quando criança todo domingo antes da divisão de salas na Escola Bíblica Dominical.

Realmente, temos que concordar: A EBD é "uma escola sem igual", pois é a universidade de transformação de vida pelo poder da Palavra de Deus. A EBD é "uma escola sem igual", pois é o espaço e o tempo de estudar a Bíblia na igreja usando meios pedagógicos inteligíveis para facilitar a comunicação e o aprendizado das Escrituras Sagradas. E, por essas e outras razões, não há outra escola na vida e da vida que se iguale a EBD.

Porém, fico intrigado com a fabricação das motivações para ir a EBD que a letra dessa música demonstra.

(1) "Quem não vem à essa escola...estava trabalhando; Quem trabalha nesse dia do senhor está roubando"

Então, quer dizer que quem trabalha no domingo é ladrão? Quem trabalha no domingo rouba do Senhor? E rouba o que do Senhor? E o que dizer do médico, do motorista de ônibus, do vigilante, do vendedor, do bombeiro, do policial, do metalúrgico e dos vários crentes verdadeiros que amam a Jesus que pegam plantão de trabalho no domingo? Esses trabalhadores são ladrões?

(2) "Do senhor está roubando quem aqui chega atrasado".

As acusações continuam. Quem não vem a EBD é ladrão. E, aquele que vai a EBD, porém, por algum motivo, justificável ou não, ainda é chamado de ladrão. Mas os retardatários ladrões são capazes de roubar o que do Senhor? O que é tirado de Deus a força pelos que chegam atrasados à EBD?

(3) "O seu nome fica ausente e ele fica envergonhado; Ele fica envergonhado por não saber a lição; Professor faz a pergunta ele diz: eu não sei não!"

A letra da música demonstra o quanto é condenado, por ser envergonhado pelo professor e seus colegas, aquele que chega atrasado e é marcado como ausente na lista de chamadas de presença da sala de EBD. 

Além disso, é envergonhado aquele que não tem conhecimento intelectual da lição ensinada. Esse retardatário é condenado por ser retardado em não passar na prova de conhecimento cognitivo da lição da igreja. Podemos perceber que a música ensina nas entre linhas que o crente espiritual é aquele que chega pontualmente na EBD e sabe decorado a lição e é aprovado nos testes intelectuais da lição.

Isso ainda demonstra que o objetivo da pergunta-teste que o professor faz da lição é para envergonhar o aluno retardatário e provar que ele é inferior por não saber da lição?

Então, quer dizer que o medo de ficar envergonhado é o maior motivo de não chegar atrasado na EBD? Essa música parece mais uma chacota legalista com aqueles que chegam atrasados à EBD. Imagine essa música sendo cantada com o dedo indicador apontado na cara daqueles que são obrigados a trabalhar no domingo e/ou aqueles que chegaram atrasados na EBD.

Imaginou?

Sentiu-se culpado?

Pronto.

Esse é o objetivo da música: Criar evangélicos cheio de complexo de culpa em relação a EBD.

Vamos (re)pensar sobre as motivações que nos levam ir à igreja, culto, EBD.

Em Cristo, que me livrou de ir a EBD pela culpa para ir a EBD pela graça de seu amor.

Jairo Filho

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A imanência das lágrimas de Deus


Não podemos negar que a nossa alma tem dimensões e recônditos que ninguém é capaz de compreender, lágrimas que não se explicam pela lógica, dores impossíveis de serem compartilhadas e que ninguém é capaz de suportar; e crises existenciais de fé, pelas quais, não há empatia possível pra consolar-nos. E, em muitos momentos de nossas vidas, é impossível esquecer daquelas noites mal dormidas quando nossa fé se perde nos labirintos de nossas crises existenciais e a solidão assalta nosso coração nos fazendo vítimas e reféns da dor. Neste cenário escuro e sombrio de tristezas e incertezas, nossos gritos de desespero e desabafo são inexprimíveis aos ouvidos da empatia do coração amigo mais próximo. O que nos resta é ter a solidão como companhia, as lágrimas como leito e o soluço como embriaguês de nossa alma.

Quando nos encontramos em tal estado de espírito perturbado, nossos sentidos, doloridos pela dor, esquecem da presença amorosa de Deus em toda a realidade de nossa existência, que partilha conosco de todas as experiências de nossa alma. Esta presença revela a imanência de Deus na existência humana. Ou seja, Deus está envolvido e permanece dentro de sua criação, pois ela depende Dele para existir e manter-se em atividade. Porque nós mesmos estamos imersos em Deus como fundamento de toda realidade existencial. Isso implica dizer que Deus não está distante nem desinteressado por nossas crises existenciais. Isso nos faz saber e crer que os gritos de nossa alma são sempre ouvidos por Deus no silêncio de nossa fé.

A imanência de Deus foi revelada na encarnação de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo na história humana. Sua encarnação faz o Deus Emanuel um de nós e imanente na identificação das realidades e crises da existência humana. Assim como nós, nosso Senhor Jesus Cristo de Nazaré foi encontrado em forma humana. “Embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo que devia apegar-se, mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens. E sendo encontrado em forma humana...” (Fp 2:6-8), ele possuiu um frágil corpo de sangue, músculos, fibras nervosas, ossos e alma/espírito. E suas fibras nervosas e sua alma sentiam as mesmas dores que todos nós sentimos.

O Filho de Deus veio ao mundo envolto em sangue e lágrimas numa pobre majedora, nasceu na periferia do mundo, cresceu pobre, viveu nossa história, conheceu nossos valores, sofreu nossos problemas, sentiu nossas dores, foi oprimido e desprezado, ficou deprimido e angustiado, sentiu-se abandonado e incompreendido, participou de nossos sonhos e esperanças até morrer agonizando numa cruz envolto em sangue e lágrimas. Cristo viveu aprendendo e sofrendo como homem, a ser humano como nós. O teólogo alemão Jürgen Moltmann disse: “Deus não se revelou em Jesus para tirar nossas dores, mas para compartilhá-las. Em Jesus, Deus revelou-se a nós como um Deus sofredor. Ele entrou em solidariedade com a humanidade”. Em outras palavras, na cruz, o sangue de Cristo foi derramado para remissão de nossos pecados, e nos céus, a imanência das lágrimas de Deus foi derramada para consolar todos os que choram.

Mas a história da imanência das lágrimas de Deus, na encarnação de Cristo, continua na ressurreição. O Cristo ressurreto levou consigo, à eternidade, as marcas de seus ferimentos. E à destra de Deus se encontra o nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo com marcas de suas dores para identificar-se com os nossos sofrimentos por toda a eternidade. Assim, mesmo em meio a crises, conflitos, incertezas, dores e perturbações, nós podemos crer que as lágrimas de Deus lavam nossos olhos para enxergarmos, no banal, a empatia de seu amor, a consolar nosso coração e regar a nossa fé, para frutificar numa maturidade até que o caráter de Cristo seja formado, plenamente, em nós.

Em Cristo, a imanência das lágrimas de Deus

Jairo Filho

Escrito em 2006

A ditadura do novo



Nossa geração vive insaciavelmente faminta por novidades. A descontente alma humana mendiga compulsivamente nas ruas pelo novo. Vive-se mendigando novidades para sair dessa vida saturada; para libertar-se do ciclo das mesmices; para sair da monotonia; para interromper a rotina; para transformar a semana; para fugir do mesmo lugar; para não conviver mais com as mesmas pessoas chatas de sempre; para nada mais ser enfadonho; para ressuscitar do ócio; para não morar na mesma casa de sempre; para não viver mais no tédio; para abdicar da melancolia; para abolir a escravatura da agenda; para abnegar a organização; para não ser mais saturado; para não ver reprises; para mudar o hábito; para libertar-se do vício; para rebelar-se contra a ordem imposta; para romper com os mesmos usos e costumes da moda de sempre; para não ser acostumado; para não repousar na inércia; para não conhecer apenas o conhecido; para não repetir o mesmo; para não ter a mesma rotatividade; para abolir a privação do mesmo; para quebrar os mesmos paradigmas; para liquidar o sólido; para não ter nada pronto; para renunciar a tradição; para ser fora da lei; para não falar as mesmas palavras; para não escrever os mesmos textos; para romper com o mesmo padrão; para não ter os mesmos insights; para não bater o cartão de ponto do trabalho no mesmo horário; para não criar a mesma criação; para não ser antigo; para nada ser exato e previsível; para não ouvir, cantar e tocar as mesmas músicas; para desistir do mesmo caminho seguido; para tirar o time de campo e jogar em outro; para rejeitar as fórmulas; para abandonar os sistemas; para extinguir a burocracia; para não vestir o mesmo uniforme; para não comer a mesma comida; para desprezar o consagrado; para mostrar desdém a fidelidade. Enfim, para não ser mais como sempre foi; para não ter o que sempre teve; para não ver o que sempre viu; para não sentir o que sempre sentiu; para não ficar nem andar e nem parar no mesmo lugar; para não buscar o que sempre encontrou; para não fazer o que sempre se fez; para não consumir o que sempre comprou; para nunca pensar com a mesma cabeça; para nunca amar com o mesmo coração; para nunca sentir a mesma emoção; e, finalmente....PÁAARA....para não fazer leituras longas, cansativas, enfadonhas e repetitivas como esta. Mas, quem consegue realizar tudo isso?
Buscamos novidades sempre, porque a ditadura do novo cria essas necessidades insaciáveis, cria a sensação de vazio em nossa alma, nos induz a ver que tudo na vida não passa da mesmice de sempre e chega ao extremo de incitar nossa rebeldia contra tudo o que não é novo. Em nossa cultura, queremos fazer sempre de um jeito que ninguém fez antes. Enjoamos da novidade de ontem, queremos o novo de hoje. Vivemos o hoje esperando que seja feita com urgência alguma novidade pra amanhã. Porque a novidade de hoje já ficou velha faz tempo.

Do ciclo vicioso pela novidade instantânea, imediata, pragmática e rápida surge sempre uma necessidade de ter, pegar, experimentar, degustar, olhar, viver, sentir, fazer, consumir e buscar sempre algo diferente, novo e variável a cada novo instante. Porque nunca se está satisfeito com o mesmo. Em nossa cultura, nada é tão novo assim que não precise ser mais novo do que era antes. A nossa cultura sente um desprezo, um enjôo, uma gastura, um nojo, uma antipatia, um distanciamento, uma aversão, um afastamento e uma repulsa contra o mesmo. Todo o dia procura-se um novo mais novo do que o novo de ontem e de hoje. A ditadura das novidades fecha os museus e proíbe contar as mesmas e antigas histórias em preto e branco que sempre se contou. No lugar disso, abrem-se lojas que vendem variedades coloridas mais diferentes e mais novas do que experimentamos alguns segundos atrás para serem sempre consumidas a cada dia de jeito diferente.

Não é difícil perceber que o mundo de hoje é uma vitrine e uma grande prateleira de variedades diferentes, novas, inusitadas, inéditas, atuais, inovadoras, futuristas, vanguardas, contemporâneas, prodigiosas, espetaculares, extraordinárias, fantásticas, singulares, pós-modernas, extremas, descompromissadas, criativas, instantâneas, disformes e imprevisíveis. Quando pensamos em consumir os objetos de desejo que sonhamos há tempo, não há mais tempo, porque já surgiu algo novo na praça e na mídia que prende nossa atenção, atiça nossa curiosidade e cria novos desejos de consumo imediato. Isso acontece porque hoje não dá tempo para curtir o novo, porque o novo fica velho em menos de um segundo. Se parar pra olhar, pensar, gostar, pegar, saborear, sentir e consumir, já surge outro novo mais diferente do que era antes e ficamos para trás e atrasados no tempo e no espaço.

A cultura da ditadura do novo tem aberto espaço para o perigo do surgimento da cultura do aluguel, do descartável, do cru e do superficial. Podemos perceber isso no consumismo. Ser consumista não é acumular bens e usá-los por muito tempo, mas comprar compulsivamente produtos para depois jogá-los fora, a fim de abrir-se pra novos desejos, novas curiosidades, novas sensações, novos bens e novos usos. Assim, não compramos, mas alugamos, e, logo depois, descartamos. E no fim, nem usufruímos direito o que consumimos. Aqui, o tesão está em consumir novidades e não está em possuir algo.

Da mesma maneira, a ditadura do novo avança e atinge nossos relacionamentos. A ditadura do novo promove a cultura de que ninguém mais consegue conviver com as mesmas pessoas o tempo todo e por muito tempo. Disso, surgem parcerias frouxas, superficiais, descartáveis e descompromissadas. Numa relação de amizade ou de romance mais permanente sempre há aquela impressão de que se está perdendo algo melhor. Para a ditadura do novo, um relacionamento fiel é uma armadilha que fecha as portas para novas possibilidades, sensações e curtições, quem sabe, até melhores do que a que está no momento. Aqui, o tesão está em ter várias surubas existenciais de parcerias, amigos e romances diferentes ao mesmo tempo e em todo tempo para depois descartá-los e abrir-se para novas aventuras apaixonantes. O verbo amar não é conjugado nesses tipos de relacionamentos, porque isso implica em compromisso e na possibilidade do casamento. Isso acontece porque a ditadura do novo nunca admite as mesmas experiências, a mesma rotina e a mesma vida de sempre.

Consequentemente, a ditadura do novo tem exigido que a nossa cultura descarte as virtudes eternas como a intimidade, a profundidade, a espera, a curtição, a degustação, a persistência, o aproveitamento, o consumo, a continuação, a permanência, a tradição, o costume, a história, a eternidade, a admiração, a contemplação, o amor, a fidelidade, a meditação; e, conseqüentemente, descarte a nossa vida que é única e é a mesma desde que nascemos.

A nossa geração é pressionada a ter o novo para ser feliz. Hoje, felicidade é conviver diariamente com o novo. O novo é o deus de nossa geração. Mas esse deus tem deixado a nossa geração doente. A ditadura do novo tem formado uma geração faminta, liquída, insaciável, insatisfeita, desconsolada, inconformada, descontente, perturbada, ansiosa, exigente, vazia, impaciente e pragmática. Além do mais, a ditadura do novo causa murmuração, vazio, ingratidão, ciúme, tristeza, ganância, inveja, cobiça e compulsão. O pior é que diagnosticamos que não tem como não ter a mesma rotina de vida de sempre. Alguém consegue ter sempre algo novo em sua vida? Será que é necessário ter sempre algo novo em nossas vidas? Por que precisamos tanto de novidades para viver? E por que com tantas novidades consumidas, nosso coração nunca fica contente e satisfeito? E é aqui que mora o perigo. É aqui onde queríamos chegar. Por que existe esse insaciável desejo pelo novo?

A filosofia, a sociologia, a psicologia e as demais ciências humanas podem perceber, explicar e descrever as causas e os efeitos do anseio por novidades que nossa sociedade vive. Mas não conseguem curar nossa geração do descontentamento causado pela ditadura do novo. Aqui, mudamos o foco de diagnosticar a ditadura do novo para buscar a cura do descontentamento de nossa geração. E ousamos dizer, sem a menor sombra de dúvida, que a cura para esse descontentamento da alma está em viver em Deus. Porque somente Deus é o contentamento do coração do ser humano. E nunca viveremos satisfeitos, consumindo novidades impostas pela ditadura do novo. Pelo contrário, viveremos sempre algemados a ditadura do novo. E porque a busca insaciável pelo novo vira numa mesmice de todo jeito: a mesmice da ditadura do novo. A ditadura do novo se torna em mais um mesmo de sempre.

O único jeito de conseguir a liberdade contra a ditadura do novo é reconhecendo quem somos e de quem somos. Podemos dizer que fomos criados de Deus e para Deus. Depois que o homem se rebelou contra a santa vontade de Deus, o homem cometeu suicídio existencial, causando um vazio em seu coração do tamanho de Deus. Porque não há vida fora de Deus. Durante toda sua história, o homem vem tentando preencher seu coração com as variadas novidades instantâneas que surgem sempre. Mas nessa busca, o homem tem se frustrado em saber que seu coração é faminto e insaciável. Mas, há esperança. A Bíblia nos ensina a viver contentes e satisfeitos em Deus mesmo quando sofremos por perdas, mesmo quando não temos o que desejamos, mesmo vivendo nas mais diversas situações adversas, mesmo quando não sentimos o que queremos sentir e mesmo quando a vida não passa da mesmice de sempre. Quando desfrutamos de um relacionamento com Deus, recebemos uma nova vida em Cristo. E vivemos em novidade de vida; porque, em Cristo, Deus satisfaz a fome do nosso coração.

Essa é a boa notícia de liberdade contra a ditadura do novo. É a notícia de que, em Cristo, viveremos contentes em toda e qualquer situação; porque Deus nos fortalece durante todos os momentos que passarmos. O Paulo, apostolo, diz: “...aprendi a adaptar-me a toda e qualquer circunstância. Sei o que é passar necessidade e sei o que e ter com fartura. Aprendi o segredo de viver contente em toda e qualquer situação, seja bem alimentado, seja com fome, tendo muito, ou passando necessidade.Tudo posso naquele que me fortalece” (Fp 4.11-3). Esse testemunho de aprendizado veio da fé da mensagem de Deus encarnada por Jesus que nos ensina que “...o seu Pai sabe do que voces precisam, antes mesmo de o pedirem” (Mateus 6.8b). Isso é felicidade em Deus. Isso é ser livre da ditadura do novo que provoca necessidades insaciáveis. Isso é viver feliz, contente e satisfeito em Deus vivendo em toda e qualquer circunstância, seja adversa ou divertida. Assim, poderemos entregar todas as nossas necessidades nas mãos de Deus e fazer um coral em adoração com o salmista: “Como a corça anseia por águas correntes, a minha alma anseia por ti, ó Deus. A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo...” (Salmo 42.1e 2a).  

Agora não precisam me dar nenhuma novidade. Estou satisfeito com o que tenho e com o que sou. Vivo a vida simples de viver com a espetacular e divertida presença de Deus em meu coração. Agora estou contemplando o Deus da minha vida que nunca é uma mesmice.

Em Cristo, a liberdade de viver a novidade de vida por toda eternidade

Jairo Filho

Escrito em 2006

domingo, 19 de setembro de 2010

Deus não existe


"God does not exist. He is being itself beyond essence and existence. Therefore to argue that God exists is to deny him." Paul Tillich
 
Deus não existe. Ele é Ele mesmo pra além de toda essência e existência. Portanto, argüir acerca da existência de Deus é o mesmo que negá-Lo.

Deus não existe. Ele é. Eu existo. Pois existir não é algo que seja pertinente ao que É. Existir é o que se deriva do que sendo, É de si e por si mesmo.

Deus não existe. O que existe tem começo. Deus nunca começou. Deus nunca surgiu. Nunca houve algo dentro do que Deus tenha aparecido.

Deus não existe. Se Deus existisse, Ele não seria Deus, mas apenas um ser na existência.

Se Deus existisse, Ele teria que ter aparecido dentro de algo, de alguma coisa, e, portanto, essa coisa dentro da qual Deus teria surgido, seria a Coisa-Deus de deus.

Existem apenas as coisas que antes não existiam. Existir surge da não existência. Deus, porém, nunca existiu, pois Ele é.

Sim, dizer que Deus existe no sentido de que Ele é alguém a ser afirmado como existente, é a própria negação de Deus. Pois, se alguém diz que Deus existe, por tal afirmação, afirma Deus, e, por tal razão, o nega; posto que Deus não tem que ser afirmado, mas apenas crido.

Deus É, e, portanto, não existe. Existe o Cosmos. Existem as galáxias. Existem todos os entes energéticos. Existem anjos. Existem animais e toda sorte de vida e anima vivente. Existem vegetais, peixes, e organismos de toda sorte. Existem as partículas atômicas e as subatômicas. Existe o homem. Etc. Mas Deus não existe. Posto que se Deus existisse dentro da Existência, Ele seria parte dela, e não o Seu Criador.

Um Criador que existisse em Algo, seria apenas um engenheiro Universal e um mestre de obras cósmico. Nada, além disso. Com muito poder. Porém, nada além de um Zeus Maior.

Assim, quando se diz que Deus está morto, não se diz blasfêmia quando se o diz com a consciência acima expressa por mim; pois, nesse caso, quem morreu não foi Deus, mas o “Deus existente” criado pelos homens. Tal Deus morreu como conceito. Entretanto, tal Deus nunca morreu De Fato, pois, como fato, nunca existiu — exceto na mente de seus criadores.

Assim, o exercício teológico, seja ele qual for, quando tenta estudar Deus e explicar Deus, tratando-o como existente, o nega; posto que diz que Deus existe, fazendo Dele um algo, um ente, uma criatura de nada e nem ninguém, mas que também veio a existir dentro de Algo que pré-existia a Ele, e, portanto, trata-se de Algo - Deus sobre o tal Deus que existe.

A Escritura não oferece argumentos acerca da existência de Deus. Jesus tampouco tentou qualquer coisa do gênero. Tanto Jesus quanto a Escritura apenas afirmam a fé em Deus, e tal afirmação é do homem e para o homem — não para Deus —; pois se fosse para Deus, o homem seria o Deus de Deus, posto a existência de Deus dependeria da afirmação e do reconhecimento humano. Tal Deus nem é e nem existe; exceto na mente de seus criadores. 

Deus não existe. O que existe pertence ao mundo das coisas que existem OU não existem. Deus, porém, não pertence a nada, e, em relação a Ele, nada é relação.

Defender a existência de Deus é ridículo. Sim, tal defesa apenas põe Deus entre os objetos de estudo. Por isto, dizer: “Deus existe e eu provo” — é não só estupidez e burrice; mas é, sem que se o queira, parte da profissão de fé que nega Deus; pois se tal Deus existe, e alguém prova isto, aquele que apresenta a prova, faz a si mesmo alguém de quem Deus depende pra existir... e ou ser.

O que “existe”, pertence à categoria das que coisas que são porque estão. Deus, porém, não está; posto que Ele É.

Ser e estar não são a mesma coisa, como o são na língua inglesa. O que existe pertence ao que é apenas porque está. Deus, entretanto, não está porque Ele É.

“E quem direi que me enviou?” — perguntou Moisés. “Dize-lhes: Eu sou me enviou a vós outros!” — disse Ele.

Desse modo, Deus não diz “Eu Estou”, mas sim “Eu Sou”. Ora, um Deus que está, não é, mas passou a ser. Porém o Deus que É, mas não está; não pertence ao mundo das coisas verificáveis; posto que Aquele que É, não está; pois se estivesse, seria —, mas não Seria

Aquele de Quem procedem todas as existências, sendo Ele apenas um ele, e não Ele; e, por tal razão, fazendo parte das coisas que existem — mas sem poder dizer Eu Sou!

Jesus também falou da sutileza do ser em relação ao estar. Quando indagado acerca da ressurreição pelos saduceus (que não criam em nada que não fosse tangível), Ele respondeu: “Não lestes o que está escrito? Eu sou o Deus de Abraão, eu sou o Deus de Isaque, eu sou o Deus de Jacó. Portanto, Ele é Deus de vivos, e não de mortos; pois para Ele todos vivem”. Assim, os que vivem para sempre são os que são em Deus, e não os que estão existindo. A vida eterna não é existir pra sempre, mas ser em Deus.

Assim, para viver eternamente eu tenho que entrar na dissolvência da existência, a fim de poder mergulhar naquilo que está pra além do que existe; posto que É.

A morte pertence à existência. A vida, porém, se vincula ao que não existe, pois, de fato É. O que existe carrega vida, mas não é vida. A vida, paradoxalmente, não pertence ao que é existente, mas sim ao que É.

Quando falo de vida, refiro-me não às cadeias de natureza biológica que constituem a vida dentro da existência. Mas, ao contrario, ao falar em vida, refiro-me ao que é para além da existência constatável.

Portanto, Paul Tillich tem razão quando diz: “God does not exist.
He is being itself beyond essence and existence. Therefore to argue that God exists is to deny him”.
 
Ora, usando uma gíria de hoje, eu diria: Tillich tem razão quando diz: “Deus não existe!” — pois é isto que hoje se diz quando algo está pra além da existência: “Meu Deus! Esse cara não existe!”. Assim é com Deus: Não existe! Pois é de-mais!

Um beijo pra você!

Ame-o, e nunca o deixe!

Nele, que não existe, pois É,

Caio Fábio

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Por que ir à Igreja


Introdução

Por que ir à igreja? Quando faço essa pergunta quero perguntar: Por que ir ao culto no templo? Por que se reunir com outras pessoas para cultuar a Deus? Qual a motivação verdadeira para sair de casa e ir cultuar a Deus com outras pessoas? Qual a motivação para priorizar na agenda semanal a adoração em comunidade? Qual a base bíblica que nos ensina a verdadeira motivação para cultuar a Deus com outras pessoas? Diante de tais perguntas, pretendo visitar esse tema com o propósito de discernir as mais íntimas motivações e intenções do coração de quem (não) vai se reunir com outras pessoas para cultuar a Deus. Este discernimento será trazido à luz dessas perguntas; e buscaremos na Palavra de Deus as motivações verdadeiras sobre cultuar a Deus juntamente com outras pessoas.

Vamos pensar sobre este tema estruturando nossa reflexão em três partes principais: (1) Porque eu não vou à igreja. Nessa parte vamos apenas descrever e avaliar as principais justificativas de quem não se reúne para cultuar a Deus. (2) Porque eu vou à igreja. Nessa parte vamos revelar as principais motivações e intenções distorcidas, enganosas e erradas de quem vai à igreja. (3) A Bíblia me motiva ir à igreja para adorar a Deus. Nessa parte vamos aprender as motivações bíblicas para cultuar a Deus em comunidade.

Parte I - Porque eu não vou à igreja

Na atual pós-modernidade, que se já se decepcionou e hoje se rebela contra toda religiosidade institucional, os vínculos religiosos estão se acabando cada vez mais rapidamente com o surgimento das múltiplas espiritualidades subjetivas, divorciadas do compromisso com qualquer instituição religiosa. Por isso, muitos perderam de vista ou ainda não enxergaram a necessidade de se reunir para adorar a Deus periodicamente e sistematicamente com compromisso de ser membro fiel de um grupo. Assim, muitos levantam algumas objeções contra a necessidade de ir à igreja. Vejamos nessa primeira parte um vídeo com alguns argumentos de pessoas que não vão à igreja e outras 15 principais objeções:


1. Eu não vou à igreja porque Deus não habita em santuários feitos por mãos humanas. Esse argumento é construído com base no texto de Atos 17:24b. Muitos advogam que Deus é maior do que o templo; sendo assim, não há necessidade de ir ao templo para adorar a Deus. Geralmente, esse é o argumento dado por aqueles que rejeitam todo tipo de reunião comunitária para adorar a Deus.

2. Eu não vou à igreja porque Deus é onipresente e onisciente. Se Deus está em todo o lugar e sabe de tudo, então não é necessário sair de casa para adorar a Deus reunido com outras pessoas, uma vez que é possível adorar a Deus dentro do nosso quarto (Mt 6:6). E com isso, muitos usam o atributo da onipresença e onisciência de Deus (Sl 139:1-12) para não cultuá-lo no templo reunido com outras pessoas.

3. Eu não vou à igreja porque eu mesmo sou a igreja. Sabendo que todo salvo é templo do Espírito Santo, e, sendo assim, é a igreja de Cristo, não há necessidade de chamar o templo de igreja. E com isso, não há dever de sair de casa para adorar a Deus no templo, pois a verdadeira adoração não acontece num lugar geográfico, mas no coração, em espírito e em verdade. Assim, uma vez que o culto não deve acontecer no templo de tijolos, mas dentro de nós mesmos, o templo do Espírito Santo (I Co 6:19, 20), conclui-se que não é necessário ir à igreja.

4. Eu não vou à igreja porque não sou um fanático religioso. Um dos argumentos de destaque para não ir à igreja é aquele que nega a necessidade de freqüentar a igreja toda a semana para cultuar a Deus, sob a justificativa de não se tornar um fanático religioso. Alguns raramente vão à igreja, e quando isso acontece é para aliviar o peso da consciência religiosa, indo apenas em dias especiais como casamento e batismo. Esse argumento não nega totalmente a importância de ir à igreja, mas não enxerga a necessidade de freqüentar o culto na igreja toda semana.

5. Eu não vou à igreja porque o culto é incompreensível e irrelevante. Muitos justificam sua ausência aos cultos na igreja porque não entendem o vocabulário usado na liturgia. As músicas, orações e o sermão são expressos numa linguagem incompreensível e de difícil explicação. Sendo assim, todo o conteúdo do culto se torna irrelevante para todos os que buscam conhecer Deus e alcançar transformação pessoal. Boa parte dos sermões pregados é recheada por jargões eclesiásticos e um dialeto evangélico conhecido exclusivamente pelos iniciados. Além disso, os assuntos pregados são desconexos da vida real e da necessidade do ouvinte. Por isso, muitos não vão à igreja porque não entendem o idioma dos crentes.

6. Eu não vou à igreja porque há monotonia e tédio em todo o culto. Este argumento é levantado por aqueles que já visitaram uma igreja onde sua liturgia se parece mais com um funeral. As músicas são enfadonhas; as orações são melancólicas, desanimadas, decoradas e repetitivas; o ritmo e o tom de voz do pregador são cansativos; e assim, a reação do público é de sonolência contagiante e náusea repugnante. Todos saem do culto torturados pela tristeza e oprimidos pelo tédio, carregando o desespero de que serão obrigados a voltar na semana seguinte para continuar esse ciclo litúrgico engessado e penitente por toda a vida. Por isso, a sensação de liberdade provocada pela ausência ao culto é considerada melhor do que o tédio do culto.

7. Eu não vou à igreja porque o culto é irracional. Muitas expressões de culto em algumas igrejas causam a impressão de que os crentes são um bando de loucos e a igreja não passa de um hospício. As danças imitam passos de animais, os ritmos das músicas são frenéticos, a melodia da voz de quem ora provoca êxtase e hipnose, o sermão é gritado num berro ensurdecedor e manipulador, a reação coletiva do auditório é um emocionalismo irracional. E assim, o tal culto é uma lavagem cerebral doentia, depressiva e opressiva.

8. Eu não vou à igreja porque todos são obrigados e forçados a ir. Muitos carregam o trauma de infância de serem obrigados e forçados a ir à igreja como castigo. Muitos pais castigaram seus filhos por meio da ameaça da obrigação de ir à igreja. Muitos se sentiam reféns de seus tutores quando eram carregados algemados para o culto e ficavam encoleirados no banco da igreja, amarrados pela camisa de força do legalismo religioso, enquanto seu coração esperneava de desejos pela libertinagem do mundo fora da igreja. Por isso, muitos vêem hoje o culto na igreja como um presídio moral ou uma casa de tortura espiritual.

9. Eu não vou à igreja porque todos os que cultuam são pecadores hipócritas. A decepção com a igreja produz o cinismo de encarar todos os cultos como o teatro moral dos crentes hipócritas. E a maior reação de vingança contra o trauma da tortura religiosa sofrida - quando descobre que a maioria dos crentes são tarados mascarados de santos - é ter ojeriza e desprezo por cultos na igreja.

10. Eu não vou à igreja porque sou condenado por ser quem sou. Muitas pessoas se sentem pecadoras demais para ir à igreja. Exemplo: Experimente convidar um travestir para ir à sua igreja. Tenho quase certeza de que a resposta dele será: “Não vou. A igreja não vai me deixar entrar nem me receber. Sou pecador demais para ser aceito na igreja”. Muitas igrejas não estão preparadas para receber pecadores em seus cultos. O culto dessas igrejas é feito por e para pessoas religiosamente perfeitas. Seus olhares de condenação apedrejam todos os pecadores carentes da graça de Deus. A discriminação pelos pecadores rouba o lugar da graça de Deus oferecida a todos. Quem ousa entrar nesses cultos, entra num julgamento litúrgico tenso que resulta numa penitência obrigatória de disciplina e discriminação. A tristeza, o medo e o castigo fazem parte de todo o culto. E quem sai do culto, leva consigo mesmo o coração ferido pela imagem de um Deus opressor, tirano e carrasco.

11. Eu não vou à igreja porque as panelinhas da igreja me excluem. Muitas pessoas deixaram de ir à igreja porque não encontraram brechas para o encontro humano, a convivência e a amizade. A antipatia, a indiferença, o medo do diferente, a discriminação, o exclusivismo destrói uma recepção calorosa, simpática, graciosa, aconchegante, digna e amorosa de boas vindas. Acredito que a falta de relacionamentos sadios e verdadeiros seja a principal causa da ausência aos cultos e da rejeição ao convite para ir à igreja. Muitos deixam de ir à igreja porque experimentaram um cenário eclesiástico de guerrilhas políticas, rivalidades ministeriais, competições legalistas de espiritualidade, muitas intrigas de irmãos etc.

12. Eu não vou à igreja porque não concordo em dar o dízimo e a oferta em dinheiro. Outras pessoas desistem de ir à igreja decepcionadas com os apelos dos pregadores da prosperidade financeira que tem enriquecido a custa das ofertas voluntárias do povo simples, carente, inocente e cheio de fé. E com isso, todos os cultos são generalizados e qualificados no mesmo patamar.

13. Eu não vou à igreja porque nada me agrada no culto. Algumas pessoas insatisfeitas negam o convite para ir à igreja porque o culto não é atraente nem agradável aos seus critérios de avaliação litúrgica. Vejo pessoas super exigentes reclamando da arquitetura do templo, do nível social dos membros da igreja, do som, do repertório das músicas, da mensagem pregada, do tempo de duração do culto etc. Enquanto uns querem que o culto seja um show de entretenimento, outros querem que seja feito igual aos cultos tradicionais do passado. Enquanto uns querem um culto que agrade somente a si próprio, outros querem fazer um culto que agrade a todos.

14. Eu não vou à igreja porque não tenho tempo. É a justificativa dada geralmente por quem trabalha muito ou daqueles que não priorizam em suas agendas um momento para cultuar a Deus na igreja. Estas pessoas trocam o dia de adoração na igreja pelo descanso em casa ou inventam algo mais importante para fazer bem na hora do culto e usam esse pretexto para não ir à igreja.

15. Eu não vou à igreja porque eu não quero. Alguns dizem que nada no culto desperta vontade de ir à igreja. Não há um só grande motivo que os atraia para a igreja. Nada os convence de ir à igreja. Outros até são convencidos que devem se reunir para cultuar a Deus juntos, mas não priorizam em suas agendas os cultos e são atraídos por outros compromissos, ou se deixam dominar pela preguiça, ou fabricam desculpas descaradamente fajutas para disfarçar o desejo real de não ir à igreja; porque, simplesmente, não querem.

Conclusão: Todas essas justificativas nos conduzem a verificar o seguinte sintoma: Além de não irem ao templo cultuar a Deus, muitos nem sequer lêem a Bíblia ou oram em casa com suas famílias e/ou amigos. Geralmente, quem dá essas justificativas nem sequer cultua a Deus sozinho em casa; assim, sua comunhão com Deus se torna cada vez mais rara, superficial e distante. Essas justificativas merecem nossa atenção e nos conduzem a rever a necessidade de aprender sobre a motivação bíblica de freqüentar o culto público.Além disso, a negação de ir à igreja merece nossa atenção porque aponta para as fraquezas da identidade e missão da igreja de ser igreja; e, consequentemente, nos chamam a rever o conceito bíblico da espiritualidade da igreja criada e descrita por Jesus. 

Em Cristo, que chama todos a irem à sua Igreja, até mesmo os que não gostam de ir à "igreja"

Jairo Filho
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